A previsão é da Agência Internacional de Energia e tem em conta os preços máximos dos últimos 15 meses – acima de 51 euros por MWh – atingidos em janeiro nos mercados grossistas europeus de gás. Para Portugal, o Mibgás aponta para 47 euros por MWh, com impactos esperados pelas empresas que ainda estão muito expostas ao gás natural.
Jornalista: Bárbara Silva
Depois de já ter registado uma subida de 18% no último trimestre de 2024 – para uma média de 44 euros por megawatt-hora –, o preço do gás na Europa prepara-se para disparar mais 30% em 2025, prevê a Agência Internacional de Energia. Só em janeiro, o valor dos contratos de futuros do índice holandês TTF – considerado a referência europeia para o gás natural – já ultrapassou a barreira de 51 euros por MWh (o valor mais alto desde outubro de 2023). Na Península Ibérica, o Mibgás indica que os preços para Portugal e Espanha estão perto de 47 euros por MWh.
Por cá, as empresas estão atentas às movimentações dos mercados e têm vindo a pedir ao Governo medidas para travar custos com a fatura energética. José Eduardo Carvalho, presidente da AIP – Associação Industrial Portuguesa, diz que, a verificar-se a previsão da AIE, "obviamente haverá impacto nos custos da energia, sobretudo nas empresas que estão fora do comercializador de último recurso e ainda muito expostas ao consumo de gás natural". Além disso, sublinha, o aumento poderá sentir-se também "nos custos da eletricidade, dependendo da disponibilidade das fontes renováveis ao longo do ano".
Obviamente haverá impacto nos custos da energia, sobretudo nas empresas que estão fora do comercializador de último recurso.
José Eduardo Carvalho
Presidente da AIP
No entanto, o responsável lembra que, "qualquer agravamento nos preços do gás será sentido em todas as economias europeias, a maior parte delas mais expostas ao gás natural do que a portuguesa, cuja competitividade não será afetada". E lembra que existem vários apoios diretos e indiretos às empresas. "Não podemos dizer que faltem instrumentos e envelopes financeiros. Estes apoios vão chegando, mas devem tornar-se mais ágeis", recomenda.
Face à média da UE e da Zona Euro, a indústria nacional tem o gás 16% mais barato, mostram os dados da ERSE relativos ao primeiro semestre de 2024. O mesmo não acontece quando a comparação é feita com Espanha: as empresas do país vizinho têm faturas de gás 14% inferiores às de Portugal. Apesar disso, deste lado da fronteira o peso das taxas e impostos no gás "assume um valor baixo – 2% –, tendo um impacto reduzido no preço final pago pelos consumidores não domésticos", refere o regulador.
As variações do preço do gás nos mercados grossistas não são diretamente transponíveis para os preços finais.
Álvaro Laranjo
Diretor executivo da APEG
Do lado das empresas gasistas que operam no país, a associação que as representa frisa que os preços para os consumidores não dependem unicamente do custo da matéria-prima. "As variações do preço do gás nos mercados grossistas não são diretamente transponíveis para os preços finais", disse ao Negócios o diretor executivo da APEG, Álvaro Laranjo, frisando que as empresas que compram e vendem gás "têm a sua própria estratégia" para lidar com eventuais subidas acentuadas.
UE tem de importar 100 cargas adicionais de GNL em 2025
A justificação para o disparo dos preços do gás no início de 2025 surge do outro lado do Atlântico: com as temperaturas abaixo de zero nos Estados Unidos (que é hoje o maior fornecedor da Europa, com uma quota de 47%), as exportações de gás natural liquefeito (GNL) para a Europa ficam em risco. Além disso, o inverno europeu está a levar a um maior consumo, com o armazenamento na UE em 55% (de acordo com a associação europeia de operadores de infraestruturas de gás – GIE), podendo baixar para 30 a 35% até ao fim de março.
De acordo com os analistas, o ritmo a que os países europeus estão a recorrer às suas reservas é "preocupante" e obrigará a importar 100 cargas adicionais de GNL, no valor de 5,8 mil milhões de euros, de acordo com os cálculos da Reuters. Isto depois de a Rússia ter parado de injetar gás nos gasodutos que atravessam a Ucrânia, no início de 2025. Por causa disso, a AIE calcula que este ano a Europa receberá menos 15 mil milhões de metros cúbicos de gás natural russo via "pipeline", face a 2024. Como consequência, terá de importar mais 15% de GNL em 2025, muito dele vendido pelo regime de Putin, já que não está sujeito a sanções.
55 Armazenamento
O inverno europeu está a levar a um maior consumo, com o armazenamento na UE em 55%.
No ano passado, as compras de GNL da Europa à Rússia aumentaram 17% e atingiram máximos históricos, sendo aquele país já responsável por 33,3% das importações da UE (o segundo maior fornecedor, depois dos EUA). Via gasoduto, importa apenas 10%. França, Espanha, Bélgica são os países que mais compram GNL russo (85% das importações).
"O aumento de 9% na procura de gás natural na Europa, combinado com fluxos mais reduzidos de GNL (-12%) e as incertezas que envolvem as entregas de gás russo são fatores que pressionam os mercados e fazem aumentar os preços", diz a AIE. A necessidade de voltar a encher as reservas de gás da UE no próximo verão e a competição feroz por parte dos países asiáticos pelas cargas de GNL disponíveis também contribuem para a escalada de preços.
Recém-regressado à Sala Oval, Donald Trump já garantiu o seu compromisso de "garantir um fornecimento seguro" de GNL à Europa, dando "prioridade à segurança energética" da UE. "Vou garantir que continuam a receber gás. Quanto mais comprarem aos EUA, mais o preço vai descer", disse Trump, ameaçando com a imposição de tarifas aos países, se isso não acontecer.